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domingo, 15 de setembro de 2013

"O Armazém e Outras Estórias" de Patrícia Madeira [Opinião Literária]


Título: O Armazém e Outras Estórias
Autora: Patrícia Madeira
Ilustrador: João Raposo
Editora: Escrytos/Edição de Autor

Sinopse:
Com temas muitos distintos, que vão do amor, à solidão, à velhice, ao sexo, à morte, à amizade, à unreality TV até ao fantástico, O Armazém e Outras Estórias revela-nos a ansiedade e a insegurança que temos connosco próprios, que jamais ousaremos contar a alguém, e a certeza que estamos sozinhos mesmo quando rodeados pelos nossos mais queridos.
Em O Armazém e Outras Estórias pratica-se um requintado exercício de voyeurismo dos costumes, num desfile de fantasias, anseios, equívocos, manias e pequenos milagres que povoam o quotidiano de personagens maioritariamente anónimas. Num estilo fotográfico e linguagem elegantemente despudorada (já revelados em 2001 Instantâneos de Sapo) dá-se corpo a um universo que pode ser tão hilariante e patético, ou terno e improvável, quanto a vida de cada um de nós. Entre alguns dos contos mais emblemáticos destacam-se A confidente – o que poderá levar um indivíduo com fobia social que viaja numa carruagem do metro a sentir-se seguro para partilhar as suas angústias? –; A porca, em que um caso de amor alternativo tem um desfecho inesperado; e Roy Blue está na cidade, o qual revela o que mais se poderá ter, além de fama, para deixar a nossa marca no mundo.
São 18 estórias escritas numa perspetiva individual e intimista, ilustradas por João Raposo.

Opinião:
O Armazém e Outras Estórias consiste num conjunto de 18 pequenas estórias intimistas e refrescantes explorando temas como o amor, a solidão, o sexo, a morte e a amizade. Não sendo propriamente uma leitora ávida de contos, esta coletânea surpreendeu-me pela diversidade de temas abordados, pelo humor implícito em cada estória e pela escrita crua e realista que a autora emprega.
O conto inicial – O Armazém – tem um impacto brutal no leitor. É irreverente, sensual, algo perturbador e retrata precisamente o ambiente de toda a coletânea. Foi um começo decididamente brusco, mas essencial para mostrar o modo como a autora não tem medo de chocar e ultrapassar as convenções sociais, abordando o amor e a sexualidade nas suas formas mais diversas, tal como exemplifica nos contos A Porca, Esta cidade é pequena demais e Nove centímetros. Também Roy Blue está na cidade é um exemplar desta abordagem inusitada, na medida em que apresenta a contenda interior de um artista, lidando com o peso da fama e a necessidade intrinsecamente humana de deixar a sua marca no mundo.
Mas o conto que me rendeu verdadeiramente aos encantos da imaginação de Patrícia Madeira foi A Confidente. Uma estória simples mas pujante, que brinda o leitor com uma reflexão sobre a solidão e o isolamento, com um final arrepiante e inesperado.
A autora é bastante competente na sua abordagem do quotidiano, da amargura que advém do dia-a-dia, da rotina, da necessidade de sermos algo mais que por vezes impede a nossa ligação com os outros. Os contos Amo-vos muito e Eles vão ver na segunda-feira são tributos a este ideal, retratando sem pudor esta realidade. De igual modo, importa realçar o conto A Luz, sem dúvida um dos meus favoritos, pela honestidade com que evidencia a angústia do envelhecimento e o direito à dignidade mesmo na morte.
De um modo geral, esta foi uma leitura rápida e estimulante, em particular pela escrita singular de Patrícia Madeira: sempre com um toque de humor e cumplicidade, aliado a um tom tongue-in-cheek e uma ironia deliciosa subjacente. Acompanhada de belíssimas ilustrações pela mão de João Raposo, esta coletânea certamente promete satisfazer os fãs de pequenas estórias com grandes mensagens!

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